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Leis e a falta de estrutura do Estado

Por Andréia Bahia

As leis brasileiras estão entre as mais avançadas do mundo, e a Constituição de 1988 é a maior representante desse vanguardismo. Todavia, a estrutura do Estado não garante o cumprimento dos direitos previstos na legislação. A discussão sobre a redução da maioridade penal esbarra justamente nesse ponto: se o País não garante o pleno desenvolvimento a suas crianças e adolescentes, como cobrar uma conduta legal.

A mudança, se aprovada, vai atingir adolescentes que não tiveram garantidos o que há 25 anos foi determinado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que o Estado deve garantir o direito de crianças e adolescentes à vida, saúde, alimentação, educação, esporte, cultura e liberdade. Não é preciso descrever as vezes em que o Estado falhou no cumprimento desses direitos, inclusive na proteção à vida de crianças e adolescentes.

Mas não são só as boas intenções do ECA que não saem do papel. O estatuto do Idoso, de 2003, que estabelece os direitos das pessoas com idade acima de 60 anos não garante o que está previsto na lei.

A lei garante às pessoas mais velhas, entre outras coisas, atendimento prioritário nos postos de saúde, o que contrasta profundamente com a tragédia que envolveu o operador de máquinas Luciano Alves dos Reis, de 68 anos, que morreu no último dia 15 depois de aguardar por dois dias um leito em Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

O Estado não dispõe de um aparato para garantir o cumprimento da lei e os casos de abandono de idosos em hospitais e casas de saúde por parte da família e a submissão da pessoa idosa a condições desumanas são recorrentes na imprensa.

Essa ineficácia do Estado se estende ao cumprimento da Lei Maria da Penha, de 2006, criada para proteger a mulher da violência doméstica e considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) a terceira melhor lei do mundo de enfrentamento à violência contra a mulher.

Em Goiânia, existem apenas duas casas para abrigar as mulheres vítimas de violência, uma municipal e o Centro de Valorização da Mulher (Cevam), entidade filantrópica que sobrevive graças à boa vontade da sociedade.

Mas até chegar aos abrigos, a mulher percorre a sua própria via-crúcis pelas delegacias da Mulher. Muitas são mortas mesmo depois de registrar diversos boletins de ocorrência (BO). Foi o que aconteceu com Nayane Aparecida de Araújo, 26 anos, morta com um tiro na cabeça. O primeiro BO que Nayane registrou contra o ex-marido foi em maio de 2010; o último, uma semana antes de ser morta, em setembro do ano passado.

A incapacidade do Estado de fazer valer suas próprias leis gera na população uma sensação de impotência e produz retrocessos como este: 87% dos brasileiros se posicionam a favor da redução da maioridade penal.

Andréia Bahia é repórter no Jornal O Popular*

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