Violência não é só problema de polícia
Em busca de combater a criminalidade e diminuir os casos de violência, vimos nos últimos dias ações reativas por parte do governo estadual: troca de secretário, alterações nos comandos das polícias e a garantia de mais efetivo nas ruas. Temas como o aumento de penas, a legislação penal e a superlotação das cadeias tornaram assunto obrigatório na sociedade. Mas será este o cerne da questão? Reaparelhamento das polícias, um maior efetivo nas ruas e leis mais rigorosas seriam suficientes para garantir mais segurança? É preciso ampliar nosso raciocínio.
Enquanto pensamento social, estamos focados demais na punição e nos esquecemos das raízes causadoras desta realidade violenta e abjeta. Precisamos identificá-las e saná-las. Isto o poder público não faz sozinho, ainda que tenha de ser cobrado permanentemente. Mais que punir o criminoso, é preciso evitar o cometimento do crime.
É preciso uma ação conjunta da família, entidades civis, igrejas e setores da educação para que possamos investir na formação das crianças e evitar que, mais tarde, se tornem menores de ruas e passem a marginais quando adultos. Combater a violência não é um problema exclusivo das polícias. Cada um de nós pode contribuir formando e educando nossas crianças, ensinando valores. É mais fácil prevenir que reprimir. Na verdade, é a única solução.
Ao falar sobre redução de criminalidade, temos que voltar nossos olhos para uma política preventiva e não só reativa. É indispensável que combatamos as causas da falta de segurança e não só suas consequências. É claro que tem uma fase que é de responsabilidade dos governos (educação, trabalho, saúde e qualidade de vida) mas a família tem um papel importante em todo este processo. Quem são essas pessoas que vivem no mundo do crime? De onde elas vêm? Tiveram formação, estrutura familiar e oportunidade de crescer socialmente?
A evolução de nossa mentalidade é decisiva para a redução da violência. Para sair da crise do pós-guerra, a Coreia do Sul investiu 10% do seu PIB em educação e, ainda hoje, os alunos têm escola grátis das 7h30 às 17h e os pais ainda colocam os filhos para estudar até as 23h. Têm um projeto de nação que funciona. O projeto brasileiro está falido. Há décadas tentamos resolver tudo na bala, mas essa guerra é inviável.
Acredito que cada um de nós pode contribuir com a redução da violência, atuando pari passu com o Estado, ao repassar aos nossos filhos os verdadeiros valores e acompanhando de perto o crescimento dos jovens. Sem uma ação conjunta entre Estado e sociedade ficará mais difícil o surgimento de soluções eficazes e legítimas. E cada vez mais nossas instituições estarão desacreditadas, incentivando muitos a fazerem justiça com as próprias mãos, o que, na verdade jamais poderia ser classificado como justiça.
Segurança não é problema exclusivo do poder público e do Judiciário. E precisamos entender que um investimento sério não dará resultado imediato mas, sim, a médio e longo prazo. A repressão, por si só, não é a melhor solução dos conflitos e não garante a redução da criminalidade. Uma política de segurança pública eficiente começa em casa, passa pela escola, por investimentos no setor social e respeito aos direitos sociais dos cidadãos.
É também papel da sociedade exigir investimento sólido na qualificação, valorização e aparelhamento de todas as forças de segurança pública. A Polícia Civil goiana tem um dos mais baixos do País e um efetivo insuficiente para atender a toda a demanda. Sem investigação qualificada, é impossível manter o criminoso na cadeira. Parte do chamado vulgarmente “prende e solta” é consequência disso.
Em nome das milhares de pessoas queridas que perdemos todos os dias para a escalada da violência, temos de, coletivamente, debater a sério a segurança pública.
* Rogério Leal é advogado criminalista e especialista em segurança pública.
Fonte: Jornal O Popular