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Suicídio IV – O Socorro

Por Natalício Cardoso*
Vez ou outra, uma caravana desconhecida visitava nosso buraco de sombras. Era como uma inspeção de alguma associação caridosa. Vinha a procura daqueles que , entre nós, já havia cumprido, no Vale dos Suicidas, o tempo que deveria ser cumprido na terra. Aqueles que já estavam com seus fluidos vitais enfraquecidos pela desintegração total do corpo físico. Estes eram removidos para outras regiões intermediarias do invisível.
A caravana era composta por espíritos superiores. Trajados de branco, caminhavam pela ruas lamacentas do Vale. Um deles levava na mão direita, uma bandeira brilhante, onde estava escrito: LEGIÂO DOS SERVOS DE MARIA.
Tais servos eram chefiados por um espirito de aparência respeitável, vestido de branco e tendo na cabeça um turbante hindu, preso à frente por uma esmeralda, símbolo dos médicos.
Eles entravam nas cavernas habitadas e examinavam seus moradores. Curavam, cheios de piedade, junto da lama, levantando alguns dos desgraçados tombados. Os que se apresentavam em condições de serem socorridos eram colocados em macas e levados dali. Uma voz que não sabíamos de onde vinha, guiava os espíritos socorridos para este ou aquele lugar, onde havia um de nós em condições de ser socorrido.
As macas eram levadas para dentro de veículos que acompanhavam a expedição. Estes veículos se pareciam a pequenas diligencias brancas, puxadas por cavalos também brancos, tão belos, que despertariam nossa atenção, caso estivéssemos em condição de notar alguma coisa além das nossas desgraças.
Depois de busca curiosa por todo Vale, os estranhos visitantes se retiravam de nossas vistas, enquanto gritávamos por socorro, nos sentindo desprezados, sem entender o motivo pelo qual deveríamos permanecer ainda naquele sofrimento todo.
Suplicamos justiça e compaixão; ficamos revoltados, exigindo que nis deixassem seguir com os demais. Os caravaneiros não respondiam, nem faziam qualquer gesto para nos atender.
Então, o coro hediondo de uivos, os gritos vibravam dolorosamente pelas ruas lamacentas, parecendo que a loucura coletiva havia atacado os presos miseráveis!
E assim ficávamos… por quanto tempo? Oh, Deus piedoso! Por quanto tempo ainda?
Num dia, senti-me tão profundamente cansado pelas torturas, tão fraco, como que desmaiado. Eu e muitos outros estávamos em situação idêntica, incapazes de resistir por mais tempo aquela tortura. Necessitávamos descansar e esta urgência nos obrigou a ficarmos amontoados nas cavernas úmidas e escuras.
Ali nos achávamos, quando o rumor daquelas carruagens de socorro nos chegou até os ouvidos.
Apesar do cansaço que nos invadia, saímos para a rua. As vielas e praças já estavam superlotadas pelos condenados que, como das outras vezes que éramos visitados por aquela caravana, punham-se a bradar mais alto, procurando despertar a atenção dos socorristas.
A caravana estacionou na praça imunda. Desceu o pelotão com enfermeiros e mais o chefe, sempre de avental branco, turbante com esmeralda e distintivo de médico. Começaram o reconhecimento dos que seriam levados dali. No ar, aquela voz que não se sabia de onde vinha, chamando os suicidas pelo nome, ou indicando o lugar onde se encontravam os que já haviam cumprido seu tão tenebroso castigo.
De súbito, ouvi meu nome! Eu seria libertado!
Entre lagrimas, subi os degraus do veiculo indicado. Entrei na carruagem confortável, onde se lia o mesmo lema que se via na bandeira: LEGIÂO DOS SERVOS DE MARIA.
Depois, o estranho comboio se pôs a caminhar e me pus a chorar, ouvindo o coro de blasfêmia, a gritaria desesperada dos infelizes que ficavam.
A cerração cinzenta que contemplei durante tantos anos foi ficando para trás. Deus Misericordioso! Eu estava saindo, finalmente, do Vale dos Suicidas!”
Quem tiver a oportunidade ou interesse em continuar a leitura desta obra, irá verificar que este espirito, juntamente com outros que foram socorridos naquela ocasião, serão transportados até uma Colonia espiritual denominada “Hospital Maria de Nazaré”, onde a bondosa mãe de Jesus será o anjo tutelar destes desafortunados. Ali descobrirão tão grande é o amor de Deus que não desampara nenhum dos seus filhos. Estes espíritos serão tratados em seus perispíritos e preparados para uma nova encarnação, que será necessária para a sua recuperação, inclusive na parte do seu perispírito lesionado no ato do suicídio. Assim, toda vez que pudermos ter contato com irmão deficientes, devemos rogar a Deus por ele, pois poderemos estar de frente a um ex-suicida, que trouxe para o seu novo corpo físico a consequência do seu ato ( escândalo ) em vida passada, fazendo valer a sabia máxima de Jesus Cristo: “Se tua mão ou teu pé é motivo de escândalo, corta-os e atira-os longe de ti…”(Marcos, cap. XVIII, v. 6 a 10). Ainda a respeito deste vocábulo, observo que, “no sentido evangélico, a concepção da palavra escândalo, tão frequentemente empregada, é muito mais geral; por isso, em certos casos, não se compreende sua acepção. Escândalo não é somente o que ofende a consciência do outro, mas tudo o que é resultado de vícios e imperfeições dos homens. Toda má reação de indivíduo para indivíduo, com ou sem repercussão. O escândalo, nesse caso, é resultado efetivo do mal moral”.

*Natalício Cardoso da Silva é Delegado Regional da Polícia Civil de Goiás

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