Por que as crianças morrem?
Por Natalício Cardoso*
A morte geralmente dilacera corações.
Quando se trata de crianças em tenra idade, parece ainda pior.
À dor dos pais, une-se a dos amigos e conhecidos e ela vai crescendo como uma bola de neve.
Normalmente termina com gritos de revolta contra a divindade e sua sabedoria.
Ou então as criaturas clamam a Deus, crendo-se por Ele esquecidas.
Compulsando o Livro dos Espíritos, vamos encontrar a questão n° 199 e por conseguinte a sua resposta nos seguintes termos:
– Por que a vida se interrompe com tanta frequência na infância?
“A duração da vida da criança pode representar, para o Espírito que nela está encarnado, o complemento de uma existência interrompida antes do término devido, e sua morte, quase sempre, constitui provação ou expiação para os pais.”
A morte de crianças, seres recém iniciados na vida física, desafia há séculos a inteligência humana, que busca razões filosófico/religiosas para os motivos desta ocorrência.
À luz das religiões tradicionais fica difícil, senão impossível, entender Deus que, aparentemente de forma injusta, retira do seio familiar seres ainda não comprometidos perante a lei divina, na visão da unicidade da existência.
No Espiritismo, doutrina que demonstra as múltiplas existências do Espírito – reencarnação –, encontra-se explicações lógicas para tal ensejo, compreendendo a perfeita justiça e misericórdia divina na morte das crianças.
Na obra Evolução em Dois Mundos o espírito André Luiz afirma que “Muitas existências são frustradas no berço, não por simples punição externa da Lei Divina, mas porque a própria Lei Divina funciona para todos nós, desde que todos existimos no hausto do Criador”.
A lei de causa e efeito é inexorável a todas as criaturas. Quando a lei divina é violada, faz-se necessário a reparação inevitável pelo agente causador, para o seu próprio prosseguimento evolutivo.
“Frequentemente, através do suicídio, integralmente deliberado, ou do próprio desregramento, operam em nossa alma calamitosos desequilíbrios (…)” que “(…) determinam processos degenerativos e desajustes nos centros essenciais do psicosssoma (…)”, afetando no campo da natureza íntima do ser, que necessitam de reajustes através dos processos cármicos reencarnatórios.
Frente ao impacto da desencarnação provocada, a alma entra em “pavoroso colapso” e “indescritíveis flagelações”, que podem conduzir estas mentes perturbadas, já na dimensão espiritual, para processos de loucura profunda.
Torna-se imperioso, após certo período na erraticidade, a reintegração deste Espírito no plano carnal, como enfermos graves, em breves períodos de vida física, para, com a colaboração dos encarnados, reabilitarem-se gradativamente dos débitos adquiridos conjuntamente.
Então renascem Espíritos comprometidos em corpos com debilidades físicas ou mentais, para tratamento e recuperação do corpo espiritual em distonia.
Quando ocorre a morte acidental ou violenta de crianças, muitas vezes, são reações de um Espírito comprometido em existência anterior a problemas do suicídio associado ao homicídio, sendo esta dolorosa forma de desencarne a tradução inevitável no ciclo do resgate.
Excetuando os casos de Espíritos missionários ou em estágios de provação, as existências interrompidas no alvorecer da vida física “(…) representam cursos rápidos de socorro ou tratamento no corpo espiritual desequilibrado por nossos próprios excessos e inconsequências (…)”. (André Luís, Evolução e Dois Mundos)
Assim podemos indagar se o homem só tivesse uma existência, e se após essa a sua sorte fosse fixada para a eternidade, qual seria o merecimento da metade da espécie humana, que morre em tenra idade, para gozar sem esforço da felicidade eterna? E com que direito seria ela libertada das condições, quase sempre duras, impostas a outra metade? Uma tal ordem de coisas não poderia estar de acordo com a justiça de Deus. Pela reencarnação faz- se a igualdade para todos: o futuro pertence a todos, sem exceção e sem favoritismo, e os que chegarem por último só poderão queixar- se de si mesmos. O homem deve ter o mérito das suas ações, como tem a sua responsabilidade.
Não é, aliás, razoável, considerar- se a infância como um estado de inocência. Não se vêem crianças dotados dos piores instintos, numa idade em que a educação ainda não pode exercer a sua influência? Não se vêem algumas que parecem trazer inatos a astúcia, a falsidade, a perfídia, o instinto mesmo do roubo e do assassínio, e não obstante os bons exemplos do meio? A lei civil absolve os seus erros, por considerar que elas agem mais instintivamente do que por deliberado propósito. Mas de onde podem provir esses instintos, tão diferentes entre as crianças da mesma idade, educadas nas mesmas condições e submetidas as mesmas influências? De onde vem essa perversidade precoce, a não ser da inferioridade do Espírito, pois que a educação nada tem com ela? Aqueles que são viciosos, é que progrediram menos e têm então de sofrer as conseqüências, não dos seus atos da infância, mas das suas existências anteriores. É assim que a lei Divina se mostra de forma ampla e a justiça de Deus a todos abrange.
Deus, justo e bom, oportuniza a todas as criaturas a possibilidade de recomeço, sendo a escola da vida o educandário que merece o nosso apreço. O corpo físico, como instrumento de manifestação do Espírito, faz jus ao respeito e cuidados necessários para o seu bom aproveitamento, cabendo-nos o aperfeiçoamento em amor e sabedoria, aprimorando a Vida na busca da aproximação com o Criador.
Importante ressaltar que a criança que desencarna recebe todo o amparo dos benfeitores espirituais e recomeça na erraticidade a preparação para uma nova existência no plano físico, na maioria das vezes com uma carga menor de comprometimentos.
Termino este texto contando a história da americana Beth.
Casada, mãe de dois belos garotos, uma boa provisão de contas, problemas, amor e felicidade.
Mas Beth sentia que no mundo espiritual havia mais um menino esperando para nascer. Ela o sentia como dela. Apenas não o havia concebido.
Conseguir o garoto não foi fácil. Foram sete anos de médicos, orações, desapontamentos e dois abortos espontâneos.
Finalmente, nasceu o menino.
Ela não conseguia encontrar o nome que traduzisse “presente direto de Deus”. Por isso o chamou Marcos.
Reconhecia o filho como algo muito especial.
E era mesmo. À medida que foi crescendo, foi mexendo com a família toda.
Como acontece muitas vezes com o filho temporão, ele reabriu os olhos e os corações de pais e irmãos para novos e ricos sentimentos de amor e de felicidade.
Os irmãos mais velhos logo assumiram o papel de jovens pais.
E do “camaradinha”, como o chamavam, foram recebendo lições de paciência, compreensão, tolerância.
Sim, porque quando ele estava acordado conseguia manter um pouco maluca, a maior parte do tempo, a família toda.
Quando acordava, alguém dava o alarma: “alerta! Tufão à vista!”
Subia no piano, no armário, na mesa. Era um espírito tão cheio de vida que Beth acreditava que nunca o mundo o conseguiria domar. Ele parecia livre como uma brisa fresca.
Por vezes, ela se detinha a contemplá-lo.
Narizinho arrebitado, boca sorridente, vivos olhos azuis, cabelo louro. E pensava: “lembrarei sempre de você como é agora.”
Mas, pouco antes de fazer cinco anos, adoeceu. Leucemia. Disseram que ele iria morrer.
Naquele dia do diagnóstico, o pai montou o carro que havia escondido para o natal e deixou que o filho corresse alegremente com ele, pelo jardim antes de partir para o hospital.
Foram três semanas de injeções, dores, transfusões, pílulas. Voltaram para casa.
Começaram os intermináveis exames de sangue e as tentativas para manter o menino vivo. Sempre havia esperança…
Olhar para os olhos brilhantes e confiantes de uma criança amada, assistir à dor dos tratamentos, ver aquela criança morrer lentamente…era insuportável.
Mas Marcos morreu durante um ano inteiro.
O grande amor de toda a família não o protegeu contra coisa alguma.
Quando o corpo inchava, Beth lhe dava amor. Quando ficou cego, ela lhe contava histórias para aliviar-lhe a dor.
Quando foi acometido por hemorragia, atormentado por convulsões, ela lhe disse adeus.
Ele morreu. Ela lhe fechou os olhos.
Abraçada ao marido e aos outros dois garotos, falou: “de novo sabemos que há um menino no mundo espiritual que é parte de nós.”
Deus nos permitiu conhecê-lo e vivê-lo. A luz de Marcos brilhará pelo resto das nossas vidas. Muito obrigado, meu Deus!”
Daí termos a certeza de que a família é planejada antes do nascimento.
É por isso que, muitas vezes, as mães têm intuições de que falta mais um filho para nascer.
Ou que os noivos se sentem tão seguros ao planejarem a família, com o número de filhos, etc.
Alguns até têm certeza do sexo das crianças antes de serem concebidas. Tantos meninos. Tantas meninas.
É que muitos espíritos recordam, embora em nível inconsciente, o que de antemão haviam planejado antes de nascer.
*Natalício Cardoso da Silva é Delegado Regional da Polícia Civil de Goiás.