Missão constitucional
O novo corregedor do Conselho Nacional de Justiça, Francisco Falcão, que também é ministro do Superior Tribunal de Justiça, assumiu o cargo quinta-feira anunciando que manterá a linha de ação de sua antecessora, a também ministra do STJ Eliana Calmon. A passagem de Eliana pelo órgão foi marcada por polêmicas, devido, em parte, a decisões que mexeram com antigos privilégios da magistratura. Preservar o curso de atuação do CNJ é opção gerencial. O fundamental, nesta e em futuras trocas de guarda no órgão, é que sejam mantidos e ampliados os avanços na política correcional da Justiça brasileira, dentro dos limites estabelecidos em lei. Incontinências de oratória não podem impedir esta missão.
O Conselho foi criado em 2004, pela Emenda 45, com atribuições explícitas – entre elas, fiscalizar a administração dos órgãos do Poder Judiciário, bem como supervisionar a atuação dos magistrados do ponto de vista das atribuições que lhes cabem por força dos cargos que ocupam. Como se trata de delegação constitucional, o CNJ, ao exercer seus pressupostos correcionais, age nos limites do que a Constituição determina.
Apesar de esse entendimento ser ponto pacífico, têm sido consideráveis as resistências de dentro da magistratura contra atos do CNJ. Isto porque, ao exercer suas funções, é inevitável que o Conselho entre em terreno que, até pouco tempo atrás, era refratário à transparência que deve reger a prestação de serviços públicos. Abriu-se uma caixa-preta, e confirmou-se o que se suspeitava: assim como o Executivo e o Legislativo, há abusos funcionais inaceitáveis também no Judiciário. Existem juízes que acumulam vencimentos que, sob diversos disfarces, ultrapassam, e muito, o teto legalmente fixado para o funcionalismo público; alguns tribunais têm baixos índices de produtividade; a qualidade da missão judicante nem sempre está à altura das necessidades jurisdicionais.
A principal acusação de setores que se opõem a atos com os quais o CNJ procura corrigir distorções é que o Conselho estaria exercendo indevido controle sobre o Judiciário. Longe disso. Suas ações visam a garantir o bom funcionamento da Justiça brasileira. Tribunais regidos por condutas estritamente profissionais e cujos integrantes – magistrados e corpo funcional – deem o exemplo da moralidade que se exige no exercício de cargos públicos são pressupostos incontornáveis para dar segurança jurídica à sociedade.
Não está em questão a inviolável independência do juiz. Controlar o exercício da atividade judicante, aí incluídas ações que se devem pautar pela moralidade, não significa intervir na sagrada liberdade de julgamento. Ao magistrado se assegura o direito de decidir de acordo com seus critérios técnicos e sua consciência. Mas é legítimo, e imperativo, que o país tenha um órgão que possa cobrar profissionalismo dos juízes e obediência a seus deveres perante à sociedade, bem como coibir abusos.
Fonte: Editorial do Jornal O Globo